quinta-feira, abril 29, 2010

"O nariz", Nikolai Gogol

Boa releitura de uma pequena obra que é um belo exercício do meu humor preferido, o "non-sense", o surreal, ou numa tradução literal do termo inglês, o "disparate".

Uma história que relata o estranho acordar de um homem que se vê sem nariz. Contar mais seria estragar o gozo de deixar o leitor ser surpreendido por estranhos acontecimentos.

Vale bem a pena.

"Adão e Eva no Paraíso", Eça de Queirós

O ponto forte de Eça de Queirós são as suas descrições riquíssimas, envolventes. Mas também a sua habilidade para a construção de personagens e a crítica mordaz, ironia e sarcasmo.

Sem enredo que se veja, "Adão e Eva no paraíso" parece um exercício de escrita, como se Eça procurasse desenvolver a sua estética descritiva.

Nem alusão à bíblia, nem sátira a Darwin, história quase infantil que acompanha Adão e Eva a descobrirem a natureza.

Num segundo capítulo, nova história. Título: "A Perfeição".

Ulisses longe da sua Ítaca, preso numa ilha de "perfeição". O mesmo registo da história anterior, mas mais enquadrado com a mitologia grega e um leve pendor filosófico, na medida em que Ulisses se recusa a viver em perfeição, num paraíso, sentido o apelo da fraqueza humana, do feio, do triste, do mau, como que apelando à noção do Ying/yang, a noção de que sem mal não há bem.

"Coca-cola Killer", Maestro Vitorino D'Almeida

Um talento para mim desconhecido do Maestro Vitorino de Almeida - a escrita.

Completamente surreal, veste esta forma de humor, que é a que mais aprecio e tanto mais faz sentido por ser a mão do Maestro a desenhar tão rebuscadas e inusitadas situações - porque é fácil associar este universo meio doido à alguma loucura que todos de uma maneira geral entendemos fazer parte de Vitorino.

O enredo gira em torno de um sujeito completamente movido pelos seus interesses pessoais, num período que vai do momento que antecede a revolução dos cravos e o pós-25 de Abril, sem deixar de misturar o personagem na revolta militar e popular, desenvolvendo, no entanto, um papel pouco claro.

Fazendo uma crítica de costumes, Vitorino D'Almeida levou um pouco mais longe a obra Queirosiana, actualizando-a, escrevendo numa linguagem menos formal e exagerando sempre o tom, transformando o humor mordaz de Eça em algo mais absurdo.

Existem, aliás, duas referências a Eça de Queirós - quando o autor coloca o protagonista a clamar por um Eça em cada esquina e, já no final da história, quase reproduzindo a cena do eléctrico que fecha os "Os Maias"; Carlos da Maia e João da Ega correndo atrás do "inglês", gritando, "ainda o apanhamos, ainda o apanhamos"...

Inusitado, mas repleto de boas descrições e cheio de humor.

"A sombra da Águia", Arturo Pérez-Reverte

Invasões napoleónicas; um grupo de espanhóis que, sob a bandeira de França e seu imperador, investe contra as tropas russas.

No entanto, não se trata de uma investida suicida, como aparenta ao imperador francês, e a todos quanto os observam. Tratava-se antes de uma tentativa desesperada de se render.

Mal interpretados por todos, incluindo pelos russos, este grupo de homens é considerado heróico porque acaba por aniquilar uma boa parte das tropas soviéticas e tem, de súbito, o apoio de uma força francesa que não se dispõe a ver este bravo pelotão ser arrasado...

Interessante escrita e muito divertido enredo, sobretudo porque podemos fazer um pequeno exercício, que é imaginar quantos episódios da nossa história não terão tido uma leitura de movimentação épica, quando por vezes o que moveu os intervenientes terão sido interesses bem mais simples e nem sempre tão nobres.

Digo-o frontalmente

Hoje dirijo-me a certa e determinada pessoa, para explicar claramente algumas questões essenciais a que não posso fugir de esclarecer.

Digo, sem rodeios, que há situações em que se aponta o dedo de forma nem sempre justa, mas, aludindo a determinados aspectos fundamentais, nomeadamente ao nível de âmbitos pouco claros e, até , obscuros, que, na practica, podem transformar-se em contratempos revestidos a ironia, quando nos encontramos sozinhos a teimar, qual D.Quixote virtuoso e cego, a ver trapalhadas associadas a, claro, moinhos de vento.

Penso que é óbvia a alusão neste fandango e exercício retórico, naquela discussão que tivemos, na que quiseste ter, quando quiseste que te olhasse nos olhos para me afirmares uma qualquer banalidade revestida de argumento - argumentos prendem-se com factos e estes, quando distorcidos, são aspectos que favorecem, se vistos do ponto de vista do cada um e do cada qual. Pergunto-me se percebes onde quero chegar...

E repara que jogo, e deixa que me ria ao dizer isto, de acordo com as regras que apresentas-te naquele momento em que disseste que ias dizer claramente isto, hoje, esqueceres, e amanhã dizer aquilo. Incongruente? Não, pá, és é manipulativo.

Mas a minha saúde não me permite este desafio, porque me desafiaste, mas já não luto por nada, senão pelo prazer de te vencer. E na primeira vez que jogamos venci, respondeste com argumentos nenhuns (sacudiste a água do capote); na segunda vez deixei-te triste, de tão vexado; e na última quis-te dizer que lutavas sozinho, que já tinhas perdido há muito. Ignorei-te, sem não deixar de responder a alguma coisa.

No fim, e até por ironia do destino, ficaste só, a debater assuntos importantes, para ti, com a tua sombra - que mostra as tuas garras de criatura fraca em espírito.

Uma pequena nuvem em dia de sol

Afectos, efectivamente, afecto-me, necessariamente.

Revelo traços de felizes alegrias e depois, nem mesmo num dia de sol, evito manifestar manifestações manifestamente desconcertadas.
Limpo os lábios húmidos, de um beijo ou do salivar raivoso e nervoso, sendo que, e postas as coisas em termos de termo, terminais, eu também termino... grito novamente, porque sinto-me um cretino.

Sento-me a ver palcos passarem e mudarem diante de mim, sozinho nesta sala cheia - imagem tipo de quem se vai abstraindo.
Nego à partida tudo o que desconheço e vejo a vida dos outros passar em rodapé.

E para não me perder mais em vãs considerações, pouso a caneta, arrumo o caderno, bocejo, levanto-me e vou viver mais um pouco.

terça-feira, abril 27, 2010

"A hesitação de Maigret"

É importante começar este texto por dizer que o inspector Maigret é o meu inspector preferido da literatura policial, não necessariamente pelo personagem, mas pela narrativa que o autor (Georges Simenon) desenvolve em sua volta.

Sinto-me sempre muito envolvido na história, graças às ricas descrições de Simenon, retratos da vida parisiense em tempos idos. As longas esperas que o inspector enfrenta são sempre coloridas por petiscos e bebidas que parecem animar a muito vulgar existência do inspector francês.

No entanto, este será o pior enredo ou melhor, o pior desenvolvimento, desenlace, desfecho, de uma trama desta colecção. Censuro portanto este final que para mim, que não direi mal resolvido, me parece pouco claro e sobretudo pouco interessante ou satisfatório.

A história gira em torno de uma família e da perspectiva de um crime que se concretiza... e mais não adianto.

quinta-feira, abril 22, 2010

"Eles falam, falam..."

"E digo-te já, sem querer ser de algum modo outra coisa que não aquilo que me determina, que, sem repisar o que acabaste de mencionar, nomeadamente certas questões menos óbvias, a verdade é que a frontalidade exige que eu afirme aqui categoricamente que em determinados níveis de convivência a verdade é para ser dita, sobretudo se avaliarmos alguns altos patamares relativos às amizades e, até, noutros relacionamentos de teores que não interessa estar aqui também a lembrar ou determinar. Porque a questão, no fundo, e sem me querer alongar, é que as coisas dizem-se ou não, de acordo com alguns aspectos fundamentais a estas avaliações, sendo determinante, não só o modo como se desenrolam os acontecimentos, mas também o contexto em que aconteceram. Penso que fui claro."

"Efectivamente gostaria de a ajudar, cara amiga, a supor de forma diferente, para que não pensasse que será como supõe ser, sem desacreditar que não seria dessa forma (senão a forma das coisas serem, aliás). No entanto, só o facto de assumir como será uma coisa que não é, que pode ser, mas não é, só torna todo o exercício de continuar a ser uma impossibilidade de vir a ser o que seja. Assim, compreenda, que há coisas que se limitam a ser, sem sentirmos que são, limitando-nos a vive-las."

(Trechos retirados de conversas no Facebook; no entanto, qualquer semelhança entre isto e uma conversa normal, é pura coincidência, uma vez que quem me ouvia não chegou a ficar totalmente esclarecida...)

"O Senhor Ventura", Miguel Torga

Percurso de vida de um homem do interior do país, do Portugal rural, que parte numa jornada de aventuras, pelo mundo.

É no Oriente que acaba por se ver envolvido em amores por uma mulher, com quem casa e tem um filho. Regressa a casa, ao seu Alentejo, e é aí que o autor se reencontra com o seu sentimento telúrico, com a ligação à terra e à natureza, neste caso específico, às suas raízes.

É isto.

Gosto da escrita do Torga, acessível mas cheia de significado, parecendo-me no entanto que nada daquilo que constrói seja memorável. Li o "Bichos" e depois de ler este fico com uma certa frustração por me parecer que tão boa escrita merecia personagens e um enredo mais marcante. Tenho dificuldade em recordar a narrativa, os factos e as personagens desse primeiro que li deste autor e desconfio que o mesmo se vai passar com este "Senhor Ventura", perdido e levado na corrente da memória.

Segundo apurei, este livro costuma ser negligenciado quando se enumera a obra do autor, porque, como é explicado pelo próprio no prefácio desta edição, "O senhor Ventura" foi escrito durante a adolescência de Miguel Torga.

E eu diria, até, que este livro é ideal para jovens a entrar em idade adolescente que gostem de ler, que gostem de ler aventuras, mas que também queiram iniciar-se na leitura de autores consagrados. É um excelente exercício.

segunda-feira, abril 19, 2010

Crocodile Rock

Hoje estou nostálgico, mas estranhamente feliz - e relembrei este tema que me lembro de ouvir quando era miúdo. Tem qualquer coisa de ingénuo, mas muito alegre.

Bem alto e sem preconceito de abanar a anca. O Verão há de vir e nem tudo é mau. O sol vai animar as coisas, muito vai acontecer e a noite é uma criança.

Em baixo do vídeo, a letra para cantar bem alto.

That's the spirit!




I remember when rock was young
Me and Suzie had so much fun
holding hands and skimming stones
Had an old gold Chevy and a place of my own
But the biggest kick I ever got
was doing a thing called the Crocodile Rock
While the other kids were Rocking Round the Clock
we were hopping and bopping to the Crocodile Rock
Well Crocodile Rocking is something shocking
when your feet just can't keep still
I never knew me a better time and I guess I never will
Oh Lawdy mama those Friday nights
when Suzie wore her dresses tight
and the Crocodile Rocking was out of sight
But the years went by and the rock just died
Suzie went and left us for some foreign guy
Long nights crying by the record machine
dreaming of my Chevy and my old blue jeans
But they'll never kill the thrills we've got
burning up to the Crocodile Rock
Learning fast as the weeks went past
we really thought the Crocodile Rock would last

domingo, abril 18, 2010

Kramer violento e racista...

Há uns anos atrás, Michael Richards, o divertido Cosmo Kramer da série Seinfeld teve um infeliz episódio num clube de comédia.

Já tinha ouvido falar nisto, mas nunca me tinha apercebido que havia imagens.

É difícil imaginar a simpática figura de Kramer envolvido em tão acesa discussão- é ver para crer.

"Hurt" - há dias merdosos

"I hurt myself today/ to see if I still feel/ I focus on the pain/ the only thing that's real"...




domingo, abril 11, 2010

Omiri, 5 de Abril, Fnac do Chiado

Envolveu alguma espera aparecer na Fnac do Chiado no dia 5, para aquilo que costumam ser pequenos concertos - até gosto mais de falar em "apresentações".

Omiri é um projecto sem rede, porque junta a música "analógica" (vamos ver se este termo pega, que não sei se existe...) com a música digital, com o uso das novas tecnologias.

Partindo das raízes tradicionais da música portuguesa, Vasco Ribeiro Casais (também envolvido nos Dazkarieh) faz um interessante jogo e cruzamento de tendências e sonoridades, nomeadamente as já referidas raízes da cultura portuguesa mais a norte, mas também com a energia rock, às vezes quase "metálica" e a estética electrónica. Um caldeirão que, lá está, ferve bem alto e sem rede, sendo esta componente digital explorada o mais possível em "live act" - nada de sequências pré-gravadas e "disparadas" em palco. Portanto, usando um pedal para gravar e lançar "loops", sequências instrumentais, foi tudo gravado à frente do público. Bom, salvo, claro está, a base rítmica, trabalho quase de laboratório da música electrónica.

Uso de instrumentos tradicionais, algo transformados e processados digitalmente, e projecção de vídeo, trabalho do outro membro do duo, Tiago Pereira (responsável pelo Vídeo-jocking, conceito cuja projecção e preponderância desconheço no panorama actual).

A espera, dizia eu no início, é que tal era a parafernália electrónica que era quase impossível que tudo funcionasse em tão curto espaço de tempo. Era impossível montar tudo e acertar à primeira - muito pedal, muito cabo espalhado naquele chão...

Mas verdade seja dita, que na primeira vez que arrancaram com a actuação tiveram o contratempo de falhar o som de um instrumento e resolveram mesmo parar a apresentação e recomeçar tudo e foram aplaudidos, sinal de uma compreensão por parte do público presente, que já tinha aguardado bastante. Mesmo tendo em conta que era gratuito, foi simpático ver a boa vontade de quem lá estava.

E bem que valeu a pena esperar.

Pessoal à(s) direita(s)...

Caraças, que o bar era giro e simpático - mas se há coisa que não chupo é esta malta nova que ainda nos está a apertar a mão e já estão a dizer que gostam é de política. Invariavelmente são da JSD e têm aversão a estrangeiros, outras raças e conseguem encaixar sempre na conversa a falta de patriotismo dos outros.

Fiquei com ideia que o objectivo da conversa era impressionar a minha companhia, feminina por sinal, e que era quem o conhecia. Ela apresentou-mo e eu juro que nem tencionava encetar conversa, mas o meu esquerdismo envolveu-me de tal forma em debate que me esqueci da pobre rapariga que me acompanhava e assistia à conversa.

A conversa começou mal porque o rapaz lembrou-se de dizer que já tem recusado empregos de 500 e 600 euros porque prefere estar a fazer trabalho social a ser mal pago...

- disse-lhe que se ele recusava era porque podia (quando não se tem falta de dinheiro é fácil recusar trabalho).
- o rapaz está a trabalhar na Junta de Freguesia a "desenvolver projectos"; claro que lá está porque o tio é o presidente da mesma Junta...
- e por fim, quando lhe perguntei afinal em que projectos está inserido, já que se diz envolvido em projectos voltados para o social, para a sociedade, envolvido com o povo, respondeu-me que organiza corridas de automóveis clássicos. Admitiu a determinado momento, mostrando até um certo orgulho nisso, que é uma organização voltada para uma elite. Ora aí está, trabalho com o povo na sua máxima expressão.

Depois debatemo-nos, argumentámos e fiquei com a ideia que afinal os seus ideais de direita estavam pouco solidificados na cabeça do pobre rapaz, que acabou por ceder às minhas opiniões.

E nunca vi ninguém usar tanto e tão mal empregue, o termo "assertivo".

Até está a construir um percurso interessante, é da área do Turismo. Agora não me venha falar em necessidades do povo e tentar incutir a ideia bárbara que temos que fechar as fronteiras aos estrangeiros. Temos, isso sim, que estreitar a entrada dos mesmos, no sentido de os encaixar na nossa sociedade, evitando a imigração ilegal e a criação de guetos. Há sempre a ideia primária que os problemas se resolvem com as proibições e a criação de novas leis, quando bastava fazer cumprir as actuais.

É caso para pedir desculpa aos leitores, mas é que não houve cerveja naquele bar que me fizesse achar graça ao discurso do meu amigo social democrata.

A título de curiosidade, o bar chamava-se Xentra, que segundo conta a lenda, seria o nome que os Mouros davam a Sintra.

A cerveja é cara e pode-se fumar - o normal, portanto.

sábado, abril 10, 2010

Enday, 2 de Abril, Fnac Vasco da Gama

Sexta-feira, 2 de Abril, feriado.

Jantar e café marcado com amigos, passagem pela Fnac do Vasco da Gama para assistir ao concerto dos Enday.

Segundo informação disponibilizada pela Fnac, a banda foi formada em 2002 e a mesma apresenta-se como um grupo de 5 amigos de longa data. A banda, com raízes em Cascais, está a preparar o lançamento do seu álbum de estreia, intitulado "Green Smoke", com uma série de concertos acústicos apresentados nas Fnacs de norte a sul do país.

"Em acordo (...) com a CÁRITAS, os Cd's vendidos na Fnac revertem para angariar fundos para contribuir para a reconstrução da vida das familias da Madeira".

A iniciativa é boa e a atitude mostrada em palco também era muito boa, com o vocalista a mostrar uma grande aptidão para lidar com o público, sempre com boa disposição.

No entanto, o som geral da banda, que não era nada mau, era algo vulgar e batia em todos os clichès das bandas modernas com desejos indie e um pezinho nas novelas dos Morangos com Açúcar.

Gostei de um dos guitarristas (muito seguro e disponível para todos os riffs, muito dinâmico), embora tivesse ainda no dia anterior confessado a um amigo que já estou farto do som das guitarras acústicas com cordas de aço, preferindo a viola acústica com cordas de nylon, aquilo que aliás se houve mais pelo nosso país a um nível mais amador, ou em sons com raízes mais étnicas.

De resto, à excepção do vocalista (garra a cantar e grande atitude), não gostei muito.

No final do concerto, houve direito a conversa com o manager da banda, da qual fixei ele dizer que nada neste país funcionava ao nível dos contactos gerais - é preciso factor C, é preciso chegar aos contactos directos com os "actores" e intervenientes, agentes decisores e isso passa por uma grande rede de conhecimentos. Nada que não se saiba já, mas é sempre interessante ouvir outras pessoas falarem abertamente nestas coisas.

Recital piano Jazz, Kirk Lightsey, 3 Abril, Malaposta

Foi já em cima das 21h30 da noite do dia 3 de Abril que cheguei à Malaposta - para quem não está a situar, é só procurar no diagrama da rede do Metro de Lisboa a estação do Sr. Roubado. Era a hora apontada para o início do espectáculo, mas concluímos (eu e a minha companhia), que havia um atraso; havia pouca gente com bilhete comprado e aguardava-se que mais pessoas chegassem para o recital.

Agora, depois de me sentar no meu lugar, depressa concluí que já tinha visto uma súmula do que seria o concerto, que começou com Kirk Lightsey sozinho em palco, mas continuou com Maria Viana na voz e terminou com um momento de improviso, totalmente previsto, de uma cantora norte-americana a acompanhar a cantora portuguesa na voz.

Ou seja, aquilo que se passou na apresentação da Fnac, agora em formato long-play, por assim dizer.

Os mesmos temas e mais alguns, o mesmo sentido de humor, piadas à fraca assistência presente na sala, a mesma forma corajosa com que Maria Viana se lança aos temas numa aparente improvisação de alinhamento e sobretudo a forma calorosa como a intérprete se relaciona com a audiência.

Senti o mesmo interesse e a mesma frescura cultural de uma espécie de cruzamento entre a intelectualidade e o popular, como se de certa forma se desmistifica-se um estilo tão associado às elites.

De resto, não me ocorre acrescentar mais àquilo que já tinha sido a actuação na Fnac do Colombo, senão decalcar um pouco a informação disponibilizada nas plataformas institucionais sobre o pianista norte-americano, que apesar de tudo era quem figurava no cartaz.

Kirk Lightsey

Nasceu em Detroid em Fevereiro de '37, começou os estudos com Johnston Flanagan, estudando depois também com Glady's Wade Dillard.

Foi na Cass Technical High School que Kirk conheceu o Jazz e aos 18 anos optou por tornar-se profissional.

Obrigado a cumprir recruta, regressou a Detroid e continuou a sua carreira musical - tocou para a Motown e ainda conseguiu estudar a vertente mais clássica do piano com Boris Maximovich.

Essencialmente, Kirk Lghtsey define-se como um pianista "de Detroid incorporando a iluminação de Bud Powell, o estilo de Art Tatum e um sentimento bebop".

quarta-feira, abril 07, 2010

Maria Viana, 31 de Março, Fnac Colombo

Quando celebra 30 anos de carreira a cantar Jazz, Maria Viana vê-se à boleia (sem sentido pejorativo!) de algumas coincidências.

O lançamento de um livro que se faz acompanhar de um cd sai para o mercado, com destaque na Fnac. Ilustração a cargo de Xico Fran, artista plástico, textos de Barros Barroso, Duarte Mendonça, João Moreira dos Santos e José Duarte.

Motivo de forte interesse: o livro não se limita a retratar o percurso de uma jovem Maria Viana, porque consegue ser também um documento histórico, ao esboçar o cenário do Jazz no nosso país durante a década de 70, período em que o "pai do jazz", Luís Vilas-Boas, se envolveu na criação da "prima" escola do estilo em Portugal, o Hot Club, e na apresentação de espectáculos ao vivo nomeadamente ao abrigo do Festival de Jazz de Cascais.

Apesar de se tratar de uma apresentação musical ao vivo, não é demais estar aqui a falar no livro porque este foi o motivo para a mesma e tomou parte considerável do tempo em que estive presente na sala de espectáculos da Fnac do Colombo, que envolveu a conversa chata de editor, mas teve também o apelativo discurso descomplexado e apostado desmontar todos os preconceitos que se encontram no mundo da música, nomeadamente no Jazz, por parte da cantora, figura interessante e desconcertante.

Entretanto, ainda explicando as coincidências, a Fnac associa-se a João Moreira dos Santos, na criação de uma rubrica dedicada ao Jazz - concertos, workshops, palestras, apresentações, etc.

Por fim, Kirk Lightsey, histórico pianista, encontrava-se em Portugal numa tourné em nome próprio. Foi ele quem acompanhou a cantora, na interpretação de 4 temas, para deleite de todos presentes.

O melhor estava reservado para o fim - Maria Viana desafiou todos a acompanha-la num tema e do meio da plateia surgiu uma voz perfeita. Será qualquer coisa como Kate Tate o nome desta sua "colega de profissão", assim foi apresentada, sobre quem não encontro nada na internet, mas que é uma vocalista de firme timbre, presença, consciência. Perfeita. Mais um bocadinho e até nos esquecíamos que o espectáculo era da portuguesa.




Para quem não sabe, Maria Viana participou, antes de iniciar uma distinta carreira no Jazz, numa das primeiras girls-bands em Portugal, durante a febre dos Abba, as Cocktail - eram estas Maria Viana, Rita Ribeiro e a cantora mais tarde conhecida como Ágata.

Éder, 26 de Março, Fnac do Colombo

A determinado momento, seja em que sítio for e independentemente da cultura em que esteja inserido, houve e haverá sempre alguém que se lembra de pegar na guitarra acústica, ou num semelhante, e começar a tocar e cantar para quem o queira ouvir.

Neste caso, é em crioulo de Cabo-verde que este Éder se expressa neste trabalho de estreia, o seu primeiro álbum, a solo, intitulado "Perfil" - possivelmente um clichè entre tantos, que se encontram nestes cantautores.

Baladas românticas, slow soul, música pop, tudo na sua língua materna - tudo terreno já batido e nada de original.

Salvou-se o bom ambiente que a certo ponto se instalou, quando o artista resolveu que teria a plateia, que se compôs com a chegada de rostos familiares a Éder, a cantar com ele os refrões nessa língua tão falada no nosso país, mas que é estranha a quase todos nós.

Foi uma boa solução para um final de tarde descontraído - pouca originalidade, muito valor, trabalho honesto. Sem mais pretensões. E o preço foi apetecível.

De volta

O escriba voltou a ter net. Já diz a publicidade que, podia viver sem net, mas não era a mesma coisa.

Stay tuned...