domingo, setembro 16, 2007

E ao findar do dia...

Mais um copo de veneno, mais um tempero ameno. Estou sereno, escrevo ao ritmo frenético dos sons, dos tons... busco inspiração em coisas pequenas. Nada de sofrimentos, alheamentos, enfadamentos.
Entretanho-me a brincar com a escrita, como quem experimenta cores de uma paleta imaginária.
Hoje não tenho medo; amanhã talvez.
"Good night and good luck".

segunda-feira, setembro 03, 2007

Apontamento

O mundo move-se, com tédio, numa dinâmica contraditória, insatisfatória, desejo de evasão.
O mundo fede, fode, funde-se e finge que cada qual é como cada qual, que tal, com cada cabeça, uma moral. Mas somos todos da mesma massa; assim se passa.
São tudo expectativas, mapas, cartografia emocional, metas, merdas, margens - falhamos todas. O vazio é tão grande, que o espectro descreve um arco absurdo de complexidade, tantos aspectos, tantas opiniões. Mas o vazio é sempre vazio. Porque a dinâmica é imutável - nascer, crescer, morrer.

sábado, setembro 01, 2007

Crítica de uma crítica

A ignorância não tem tempo ou lugar, ela prolifera. Quando apanho o autocarro, ou quando espero na fila do super-mercado, sou confrontado com a dita (a ignorância). Grave é quando a ignorância se revela nas opiniões técnicas, por vezes pouco apuradas. Não está em causa o gosto de cada um. Antes, a inabilidade para discernir o preto do branco.
Não me quero dizer fã de Slime Fingers, mas sou um seguidor do trabalho da banda de Torres Novas e confesso que considerei hilariante a crítica a que foram sujeitos - no texto referente ao concerto que decorreu na Meia Via, no dia 5 de Maio. Será possível errar tanto?
Vejamos; que a voz revela problemas é bastante óbvio, mas sejamos honestos e lúcidos para perceber que a única falha em termos de vocalizações se prende com uma falta de grandeza, a grandeza que a instrumentalização representa. O frontman dos Slime Fingers não arranha por caminhos indevidos, porque embora revele uma certa inabilidade para cumprir uma boa prestação, revela também uma clara noção de melodia e de encaixe, de perfeição formal – talvez falte a atitude de um frontman, um lead singer, que não alguém que se esconde atrás da guitarra.
Agora, o que eu não entendo é a perspectiva sobre o instrumental. Onde raio está a influência nu metal que é referida? Será que o peso da guitarra hoje é dia é princípio para a conotação com a sonoridade nu metal? Fui à wikipedia tentar perceber melhor o fenómeno do nu metal/nü metal/new metal (em português, metal novo). “Ausência marcada de solos de
guitarra e outros resquícios de virtuosismos típicos do Heavy metal.
Constante variação entre vocal “choroso” (
Korn, Limp Bizkit) ou suspirado (Deftones) e vocal “gritado”, raivoso ou as vezes Melódico (Incubus, Sevendust e Linkin Park).
Alguma influência da
Música electrónica, adquirida do Metal industrial e variações britânicas do Breakbeat, como é o caso do Jungle e do Drum n’ Bass.
Uso de
DJ, principalmente para accionar os samples e para efeitos de "scratch e Turntables".
Uso variado de instrumentos diferentes, tornando cada banda única por seus diferenciais.” ...perdoem-me a ironia, mas estamos claramente perante uma banda com grandes influências nu metal... a começar pela ausência de solos com que os Slime Fingers nos brindam.
Depois não entendo a antítse, a contradição de ideias, o disparate: a banda tem potencial ao nível do instrumental, mas ao mesmo tempo não sabem que rumo tomar? Uma banda sem rumo não tem potencial, tem contas a fazer e ideias a explanar. É do senso comum e do bom senso – é preciso ter rumos definidos quando se compõe metal progressivo, ou há o risco de divagação, contradição, disparate. O mesmo princípio aplica-se aos textos jornalísticos.
Sobre a atitude punk, referida como dispensável, faz parte de uma abordagem que considero inteligente por parte da banda. O Metal progressivo não prima pela interacção com o público ou grandes estados de extase em palco. É preciso saber digerir esta sub-categoria do metal e é preciso gostar muito, ou torna-se aborrecido – é muito técnica. Trata-se de uma nuance estilística, não um problema de qualidade.
Depois de ler a crítica "fiquei-me" a contemplar o remate: “a banda de Torres Novas necessita de bastante trabalho”. Curiosamente, concordo. É preciso é que também quem escreve se dê ao trabalho, não se fique pela crítica fácil.

domingo, junho 03, 2007

Teia

É a teia. É a vida. São o bom e o mau que se espraiam em desconexas agonias. Não percebemos que depois do bom vem o mau e que depois do mau vem o bom. Tudo é bom, tudo é mau. Não relacionamos os pontos da vida que vamos encerrando em episódios; assumimos que "foram fases". Vivemos episodicamente, sem legendas e de forma omnipresente - personagens principais que desconhecem o que se passa na outra sala do labirinto. São teias, são enredos, somos personagens planas, se num vislumbre sobre o vale do passado.

Simples


Reflexo do poço intelectual azul, onde escondo emoções contidas, onde guardo coisas que não sei o quê. São estados vazios que segregam seiva de ternura, ou raiva, ou graça, ou alegria. São como imagens a preto e branco, que nada escondem, mas que contêm magia e duplo significado, um estado artístico. É a beleza que a vida nos oferece, juntamente com a intelectualização e o romantismo poético que o Homem (e a Mulher...) saborea como mais animal algum. É a arte.

Coisas simples


Tudo bem

O dia de ontem já se vai esbatendo na minha memória; agora, que finda o dia de hoje, agora, que perco dois segundos a pensar que amanhã será um novo dia. Fico, espectante, a pensar que amanhã pode acontecer muita coisa. Uma nova realidade, novas horas, minutos nunca vividos e que nunca se repetirão. É isso que acontece com o futuro: aguarda-se, com expectativa ou espírito de inevitabilidade, e vive-se, para depois ver tudo passar para o passado, passar à História, soma das estórias pessoais, mescla colectiva. É bonito pensar nisto, se formos aconselhados pela paz de espírito, pelo "calmo improviso do poente" e pela calma de viver. Sem angústias. Sem pressa ou sentimento de perda. É esta a nossa vida.

quinta-feira, maio 31, 2007

Lei das crianças

Mandaram-me este artigo por e-mail. Acho o texto delicioso. Divirtam-se.

"CALEM-ME A CRIANCINHA QUE NÃO CONSIGO MASTIGAR João Miguel TavaresJornalistajmtavares@dn.pt

Estava Miguel Sousa Tavares na TVI a comentar a nova Lei do Tabaco quando da sua boca saltou esta pérola: o fumo nos restaurantes, que o Governo quer limitar, incomoda muitíssimo menos do que o barulho das crianças - e a estas não há quem lhes corte o pio. Que bela comparação. Afinal, o que é uma nuvenzinha de nicotina ao pé de um miúdo de goela aberta? Vai daí, para justificar a fineza do seu raciocínio, Sousa Tavares avançou para uma confissão pessoal: "Tive a sorte de os meus pais só me levarem a um restaurante quando tinha 13 anos." Há umas décadas, era mais ou menos a idade em que o pai levava o menino ao prostíbulo para perder a virgindade. O Miguel teve uma educação moderna - aos 13 anos, levaram-no pela primeira vez a comer fora.Senti-me tocado e fiz uma revisão de vida. É que eu sou daqueles que levam os filhos aos restaurantes. Mais do que isso. Sou daquela classe que Miguel Sousa Tavares considerou a mais ameaçadora e aberrante: os que levam "até bebés de carrinho!". A minha filha de três anos já infectou estabelecimentos um pouco por todo o país, e o meu filho de 14 meses babou-se por cima de duas ou três toalhas respeitáveis. É certo que eles não pertencem à categoria CSI (Criancinhas Simplesmente Insuportáveis), já que assim de repente não me parece que tenham por hábito exibir a glote cada vez que comem fora - mas, também, quem é que acredita nas palavras de um pai? E depois, há todo aquele vasto campo de imponderáveis: antes de os termos, estamos certos de que vão ser CEE (Crianças Exemplarmente Educadas), mas depois saltam cá para fora, começam a crescer e percebemos com tristeza que vêm munidos de vontade própria, que nem sempre somos capazes de controlar.O que fazer, então? Mantê-los fechados em casa? Acorrentá-los a uma perna do sofá? É uma hipótese, mas mesmo essa é só para quem pode. Na verdade, do alto da sua burguesia endinheirada, e sem certamente se aperceber disso, Miguel Sousa Tavares produziu o comentário mais snobe do ano. Porque, das duas uma, ou os seus pais estiveram 13 anos sem comer fora, num admirável sacrifício pelo bem-estar do próximo, ou então tinham alguém em casa ou na família para lhes tomar conta dos filhinhos quando saíam para a patuscada. E isso, caro Miguel, não é boa educação - é privilégio de classe. Muita gente leva consigo a prole para um restaurante porque, para além do desejo de estar em família, pura e simplesmente não tem ninguém que cuide dos filhos enquanto palita os dentes. Avós à mão e boas empregadas não calham a todos. A não ser que, em nome do supremo amor às boas maneiras, se faça como os paizinhos da pequena Madeleine: deixá-la em casa a dormir com os irmãos, que é para não incomodar o jantar."

quarta-feira, maio 09, 2007

Esta aprendi com uma amiga brasileira

Filosofia do cavalo de 7 de Setembro: Andando, cagando e sendo aplaudido...

sexta-feira, abril 13, 2007

Carro inflamável (ainda não tirei fotos)

Há dias normais que se transformam em absoluto - absoluta demência, emergência, coincidência, parte da vivência que vamos transportar pela nossa efémera eternidade (antítse paradoxal que atormenta a Igreja...). Entrevista marcada, mais uns quantos quilómetros, mais uma conversa e o regresso. O regresso marcou-se e pautou-se por isto que vou descrever no próximo parágrafo; um novo assunto, aquele que interessa relatar.
Ia este escriba a conduzir, quando o pendura o alerta para as faíscas que saíam a seus pés; que pare, que pare, que saia, que há perigo, que temos que sair. Tinha fumo a sair do "tablier" e chamas nos pedais. Fugir do carro, que pode explodir; mas voltar para afastar as pessoas do perigo...
- Liguei para o 112 e foi bizarro. A minha chamada correu várias instituições, ouvi música e a dificuldade era dizer onde estava. Amadora, na parte alta, onde mataram os polícias, disse o nome da rua, mas nada chegava para a pessoa do outro lado da linha. "Tenho o carro a arder à minha frente, pode explodir, já disse onde estou..." até que surgiu uma carrinha de patrulha da polícia, que ajudou a controlar as chamas até à chegada dos bombeiros (aparentemente alguém soube, lá no 112, onde era rua...).
Foi um episódio meio louco. Pessoas a aparecer do nada, a ajudar, a saber se estava tudo bem. E a imagem que retive foi a do carro em chamas e o nada que eu podia fazer. Mas houve um final menos infeliz e, à excepção do carro que ficou pronto para a sucata, ninguém se magoou e nada de muito grave aconteceu. No final, a história até era contada com sorrisos, porque de tanta coisa que podia ter corrido mal, correu menos mal. É um carro que costuma ser conduzido por estradas nacionais onde não há nada à volta a não ser mato e costuma transportar duas crianças. Fico feliz por estar envolvido no acidente, porque me parece que o carro ia incendiar-se mais cedo ou mais tarde - foi problema de curto circuito... - e assim eu estava presente para ajudar.
Fim.

quarta-feira, abril 11, 2007

E o blog?

Ah pois é, que não há maneira de eu ir actualizando o blog. Para não perder o fio à meada, vou lambendo ideias no papel, na esperança de as descarregar aqui. Mas não há maneira. E a vasta plateia que segue o meu mundo perverso e surreal (quem é que eu quero enganar...) vai anseando por novas histórias, por novas depressões líricas e até por vómito, sangue, suor, lágrimas, o que eu já habituei.
Mas a espera compensa. Nos próximos posts vou descrever a seguinte bizarria: o carro onde eu seguia ateou fogo. Sobre este assunto, texto e imagens (amanhã vou tentar obter fotografias do carro queimado), e uma pequena dissertação sobre o estranho cenário que é estar diante de um carro em chamas, as coincidências que se cruzam conosco e, ainda, as dificuldades com que nos deparamos enquanto utilizadores do 112 - tão somente um número de emergência.

sábado, março 31, 2007

Acidente

Tirei os óculos do bolso, desembrulhei as hastes dos óculos que tavam no bolso e um estrondo. Um estrondo forte, cá fora, eu a meio da escada, subi a escada toda e voltei-me e nem pensei - vi dois carros embrulhados e vi fumo e vi espanto e vi o acaso fazer cruzar a trajectória daqueles dois carros. Ninguém travou. Foi o acaso. Foi um acidente. Foi uma porcaria.

Controlo

Mas é que nem controlo. Nada, digo. Não controlo nada. Vou tentando, numa luta desigual, para depois controlar nada. É que não há mesmo nada que eu controle. É um descontrolo. Mas é mesmo assim, não é?

Desvario

Abstracção, obstrução, oblíquo, oblíquo, observação: gemo, suo, perco-me. Agonia, melancolia, ia, porque ia, porque queria. E no presente? Quero. Quero muito.
Só que agora vou saltando pelos telhados, a partir tudo. E fico-me entre a saudade, o ódio e a salada de frutas.
E as flores? É que até rima com frutas e llutas, as putas.
Ai, mais um suspiro, foi outro desvario. É tudo uma questão de memória; é tão inglória. Parece que só lembra e dói por mal, que por bem estamos hoje.
E dói-me tanto o estômago de fome, que nem consigo pensar. Que giro!

Braindead

O pior é a falta de tema. É não ter do que falar. Música, não escutam, cinema, não vêem, e depois resta o trivial. Sem empregos, restam pintelhices sem interesse nenhum.

O vidro transparente da janela

Um olhar pela janela. Telhados, antenas tortas, duas torres da mesma igreja; o rio. O sol a fazer brilhar ideias que se perdem sobre as casas e os tectos e os telhados. Coisas sem interesse.
E os góticos? Em baixo, na Baixa, por lá andam. Sou tolerante, por isso não estranho, mas estranho, isso sim, o culto da melancolia e do triste. É assim? Vampirismos à parte, será possível sorrir? Anedotam sobre o quotidiano?

Chulos

Hoje não é desses dias, mas há os que não tolero o acordeão. Aquele gente suja a pedir, a "esmolar", a chatear, às vezes até a fazerem-nos sentir mal conosco, por eles passarem necessidade. São aldrabões - falam ao telemóvel, usam adereços, um até tem córneas nos olhos, só que no Metro esconde-as, para todos sentirem pena.
Nojo e vergonha.

Tragédia, catarse, fénix, mundo real

Entro na sala dos espelhos, na sala do reflexo cru, onde me vêem todas as imperfeições. Não fixo ponto, escondo o meu olhar no vazio, aqui, ali, atrás e zás! Outra fobia, outra agonia. São os dias em que somos fracos, em que o castelo de cartas cai e desmorona, abandona a posição. Nem são dias de negação. São dias em que desistimos - não amamos, não acreditamos, não defendemos causas, não somos por ninguém, apenas tememos. Medo, suor e lágrimas; sangue, receio e tremura. Depois é simples loucura, ou paranóia, mas sobretudo suores frios. Não gosto desses das, ninguém gosta.
Catarse: choro agoniado, convulsões, medo, medo, medo, morte, escuro, vazio. Abandono, miséria, fome. A morte do ser-humano, que quando deixa de acreditar, deixa de fazer sentido.
Fénix: regresso das cinzas, da queda sem fim. Deixei o medo. Todos com a expressão "sentir a brisa na face", no gesto de erguer do chão - pisados, pisados, pisados - acima da multidão, tanta raiva para dar vazão.
´Temas não, implodi, explodi, renasci, restias de força lançam nova vaga de loucura-demência-ó-razão, absoluta frente de combater. Fraternidade, fraternidade, fraternidade! Fraternidade, liberdade, coragem, querer.

(Fora do meu labirinto de rosas negras, onde existe um mundo tão negro, mas mais real, gritou-se "Portugal, Portugal, Portugal!"; a seguir vão fazer um reality-show com ditadores...)

quinta-feira, março 29, 2007

Certezas

"Quando uma coisa é verdade, é verdade. Quando uma coisa não é verdade, não é verdade" - ouvi esta na rua. Não há nada mais importante que ter as ideias bem esclarecidas.

segunda-feira, março 19, 2007

Rua...

... Augusta: comércio de um lado e doutro, o polícia de giro, os inquéritos, o assédio, a caneta que anota, o zigue-zague para fugir do inquérito, a cola, a perseguição, mais comércio e... vento! - o cabelo a desmanchar-se, a despentear-se, a dançar-se e a estante dos postais caída no meio do chão, depois do estrondo, do barulhão, do trambulhão, postais pelo chão, os putos a rir até mais não.

Vómito

Cabeça entre as pernas. Dores abdominais. Mais uma contracção, azedo, regorgitações. Puxo o autoclismo, limpo os fios de baba que se misturam com as lágrimas das contracções abdominais e dores nos rins. Volto para a cama. A cama voa. A cama é boa. A cama não pára quieta. A cama... que agonia...

sexta-feira, março 16, 2007

Cheira-me sempre a frete

Depois do boom da internet, outro fenómeno: não há porra de sítio onde alguém se dirija para pedir informações sem que nos encaminhem para a página da internet. Ninguém sabe nada, internet, internet, internet; não entendo esta nova mecânica, repete, repete, repete, internet.

Loucos à solta

Olhar vazio, preso no chão, preso no lixo que está no chão, fixo no chão... fui interrompido por um histérico que percorria as carruagens do metro aos gritos. As pessoas quase trepavam para o colo uma das outras, para fugir daquele macaco à beira do colapso.
Isto aconteceu; em Lisboa, na vida real, num metro perto de si, fora de si, assim, se sim, para mim - para mim estão todos loucos.

quarta-feira, março 14, 2007

Escrita

Tenho a escrita. Ao menos tenho sempre a escrita. Sonâmbulo, triste, decadente, ardente, demente, um idiota, em lágrimas ou armado de sorriso - terei sempre a escrita. Essa, não a pago; essa, não a devo.
Mais sono, menos loucura. Embriagado, mas já tirei os óculos de aviador, depois de ter guiado o meu abismo pela estrada, pela noite. Há dias em que transpiro loucura - são dias de vertigem, à beira do abismo. Como dizia o outro, é um histerismo que grito para dentro, é pura confusão. Mas terei sempre a escrita.

Recupero mais um texto antigo - desta vez um conto incompleto

Comecei a sentir alguém a sacudir-me. Aos poucos retomava a consciência. A vibração da janela fez-me adormecer.
Era o revisor que me abanava, na esperança de me acordar. "- Vá lá ver! Amigo, não tenho o dia todo!", dizia-me ele. Mostrei-lhe o bilhete. O homem deixou-me em paz.
Estava de novo no comboio, a caminho de Lisboa. Era mais um fim-de-semana em casa da minha tia-avó. Costumava lá ir aos fins de semana para mergulhar na agitação da cidade, para contrastar com o ambiente rural onde vivo. Em vila do Ranço nada acontece. É um local pacato, onde habito, onde todos os dias acordo para ir trabalhar. Faço a contabilidade numa oficina de pneus, numa cidade ali perto.

(Como nunca terminei esta história, que quase nem comecei, nunca soube o que aconteceu a este personagem. Acredito, no entanto, que o aguardam aventuras em Lisboa, durante este fim-de-semana. Calculo até, que a força do seu carácter vem da sua curiosidade natural e sagacidade de espírito. E imagino, que o final da aventura seria purificador, que teria um final feliz - será que desta forma terminei o meu conto?)

Índice de Massa Corporal (IMC)


O IMC calcula-se dividindo o peso pela altura ao quadrado. Se o resultado for inferior a 18, a Organização Mundial de Saúde entende que se está perante um caso de peso a menos.
(... e peso a mais, como é?)

terça-feira, março 13, 2007

Recupero aqui um texto já antigo - mais desatinos e uma consideração final

Um dia vazio de medos e cheio de convicções: sonho que vivo por instantes. Sentar e pensar que tudo funciona.
Um beijo incompleto, interrompido por uma vida arruinada, por uma vida que nunca o foi e por uma vida que será: coito interrompido.
"Deus deu-me para depois tirar", gritei inconformado.
A outra, a que tem nome de flor, falou de coisas que me encheram de desejo, beijos húmidos naquela pele morena. Senti-a perto de mim e fechei os olhos com os seus seios encostados no meu peito.
...
Transpiro frustações na sala dos corpos moldados e caminho para uma vida nova, numa passadeira de verdades inconsequentes - saio e o chão não pára de andar, levando-me sempre naquela direcção.
Mas gritam-me lá de baixo verdades que não são as minhas e acumulo rancores daqueles que amo. Porquê? Porquê importar-me com a negação do meu querer, que é legítimo, que é feito de lutas e conquistas? Porque não é aceitável na clarividência de alguém que tomou outro caminho? Dane-se!
Ja o ventre, esse sorri-me, talvez como um aliado momentâneo, que me vê na perspectiva de uma pátria distante, de um tempo de outras guerras. Amo o ventre, mas amo a liberdade que aprendi num espaço sem angústias de daí a um minuto, daí a uma hora, daí por um dia, dias, semanas, meses, anos, muitos anos, uma eternidade.
Receio menos, mas revolto-me mais, com ganas de cuspir no chão.

P.S: como um teenager revoltado e cheio de dúvidas pode fazer sentido, num sentido poético; sentido, por dores de parto de uma idade adulta, usa palavras e expressões maduras, para, numa mentalidade infantil, simular um adulto.

quinta-feira, março 01, 2007

Sax azul

Have you ever?... absolutamente! Então naquelas manhãs começadas a ritmo de primavera, com os pardais e outras passaradas que tais, e tal; acordar sem recear acontecer algo de mal.
É como aquela do Herbie Hancock, em que o piano vai cantarolando, enquanto o trompete vai dizendo que se sente bem.
Deve ser porque há dias em que viver é uma experiência agradável - o nosso clube ganhou, o nosso filho aprendeu a andar de bicicleta, o patrão deu um aumento, a loira do semáforo piscou-nos o olho, os colegas gabaram-nos a audácia, a nossa mulher deixou-se penetrar pela manhã - disse que me ama.
Há dias em que o verde não é só verde, é mesmo verde - e é nesses dias que o sol não é só sol, é o magnífico sol. São dias de sunglasses, bearglasses e outros glasses.
São dias em que acordar é uma benção e dormir uma miríade - parecia-te o quê, que estou sempre negro? Não. Até me vou deitar bem vermelho, de bater o pé no chão, da bateria imaginária que não me sai da cabeça...

... de volta ao apocalipse e aos meus demónios pessoais...


E no meio de todo este apocalipse...


Todos se dizem inconstantes

A descoberto o sangue, o suor e as lágrimas - embrulhada no meu colo de voz grave, soltas o gemido vencido que eu acalento; com rouquidão, mais uma festa, mais uma carícia de irmão.
Não temas nem chores, nem cedas. Estou aqui. Não fujas, não inundes, estou aqui para ti. Sou teu e tu és minha... protegida. Canto-te versos de côr carmim, sinto a tua respiração cheirar a jasmim. Absolutamente nada sem ti, uma ode triunfal assim: contigo nos meus braços.
Tomo mais um golo do meu café, amargo, tal qual páginas de um livro negro; picos, altos e baixos, revés... cães corridos a pontapés. É a vida, meu amor, chora no meu ombro, que estou aqui para te ouvir.
...
Um soluço, mais uma crise. Temo pela generalidade do abismo, a inconstância. É geral, todos se dizem inconstantes. É total. Todos a carpir mágoas mil, todos a agir com medos mil. Todos sofrem, todos se queimam nas brasas, todos se deitam no caixão.
E eu? Eu afundo os pés vincados no chão e... fraternidade. Sim. Sim, fraternidade. Só assim. Sem verbo nem sintaxe - só fraternidade, estendendo amor aos que amo com paixão e aos que não amo, senão, por bem querer a outros que guardo no coração.
Confio em mim, heis porquê. E sinto os ombros fortes o suficiente para amparar a queda do mundo.
Hoje não há palavras duras, nem agonias e azedos. Hoje sou só um ombro amigo.

terça-feira, fevereiro 27, 2007

As histórias que espeto em papel

Imagino histórias lindas para as desmembrar brutalmente com lâminas de prata e medo. Ando no verde campo, para poder pisar as flores. As flores, essas putas que têm nome redondo e que não têm, na sua forma escrita, arestas e bicos, dureza - só apelidadas de putas as posso escrever.
Não sou louco. Mas permito-me criar no papel um mundo imaginário, um só meu, onde violo a gramática e esfolo o português... e onde chamo putas às flores, que é só para usar expressões negras, pretas, setas apontadas aos corações. Gosto do som da morte, do corte, da esfínge, e do som da boca que se rebenta, partida à paulada.
... desta vez sinto que excedi. Que sou um parvo com sono. Ou então iludo-me com a gramática e com paredes cobertas de sangue, para amanhã acordar feliz e contente.
Defeito genético!

Pseudo-suicídio

Olá, outra vez! Mais um dia. Afinal ainda cá ando. Foi outro dia que não primi o gatilho e que desisti do tubo encaixado na boca. Hoje não é dia de morrer.
Nojo...
Pescoço vermelho, inchado; é a marca da lâmina, senhor. Sim, aquela que encostei ao pescoço, enquanto me cintilavam os olhos de loucura e desprezo por mim mesmo.
Pseudo...

Gritos

Gritei o pontapé que dei no muro, a seco, no frio, a unha que partiu, que rebentou do dedo que estalou sangue, dormente dedo medo, tiro o pé dali que dói, mas bati... água morna que banha o pé, o sangue dilúi, o olho chora, o nariz funga, a mãe conforta... sai por essa porta! Fujo e grito, evito falar, revelar, expôr-mostrar! ...cala-te!
Isto: palavras que personificam o azedo do vomitado na boca de toda a gente, uma dor de cabeça tempora acima. Cala-te! Cala-te!
Empurro-me contra as estacas; porque dói, porque me trespassam, porque sim, por tudo, por nada.

Fica

Não vás! Não vás embora, que há quem te queira. Não é pelo que eu te amo, mas por quem eu amo, que te ama a ti. Fica para aquele festim que te prometim, pim, pim!...

Auto-flagelação lírica

Mais uma página do louco. Mais uma página, estava rouco; não tinha espaço, não há traço, mas esgravato mais umas linhas neste papel branco que ninguém lê senão eu - estarás tu a ler, mas desta tela de luz, onde penso e divago numa segunda vaga.
Volto a deleitar-me com palavras duras, laminadas, que doem que ferem, que atiro contra a parede para as ouvir partir, estilhaçar - escrevo palavras à procura das arestas, como cabeçadas na parede, como socos num estomâgo desprotegido. É como um jogo de choque e de espanto: discurso agressivo, nojento, árido, absolutamente, estoicamente, mente, mente, mente-me, mente à minha mente.
Roubem-me o passado e empurrem-me no vazio, criem um paradigma do absoluto, do branco vazio, do colapso mental de imemória, de inglória - um passado inexistente, memória fria ou quente. Um precipício, um pé na berma, na queda, na merda, naquele tubo que te parte os dentes à pancada, à cacetada, do medo da dentada, enquanto pendes no muro, agarrado à rede... memórias, histórias. Tudo merdinhas que fazem de nós qualquer coisa pronta a mudar, pronta a vestir, pronto a comer, comer.

É o silêncio

Não disse nada... não, não disse nada. Larguem-me, não disse nada! Ou então verbalizei o pensado, aquele sentimento prensado. Um desiquilíbrio, uma tontura. Mas já foi, agora deixem ouvir o silêncio.
Já disse que não disse nada! Foi só um gesto de incerteza, um suspiro! Um reflexo de medo... sim, de medo! Porque não há valente sem fraqueza, sem se transformar em preza, um buraco vazio à pressa, vai à merda! Sim, tu que julgas pela capa do livro, esse onde descrevo os excrementos que me atiram como cuspo, como palavras cuspidas, como palavras fodidas, facas que cortam. Chora, eu choro, eu imploro, eu sou, eu sou uma poça de lama, uma poça de germes e outras coisas de nojo e tortura, outra tontura... e descalço sobre os vidros partidos, sangue, suor, ardor. Vai à merda... vai tu!

sexta-feira, janeiro 19, 2007

Fundo

Sombra

Ficou a sombra. Ficou aquele ali para quem olho. Fui ver o mar e voltei tarde. Voltei agora, tarde para te ver, mas nunca tarde para escrever. Escrevo, analiso o sentimento, um fragmento, um pedaço de melancolia. Triste.
Mas aquela sombra já não é nada. Já não o era.
Um par de dias volvidos e a sombra era gente, assim seria contente. Mas o fim existe, triste, e tu ris-te.
Clepto-coisi-tal, os maníacos. Roubaram qualquer coisa que tinha. Saudade-ó-qualquer coisa, dos ausentes.
Mais um trago no meu copo de vinho, outra esquina. Mas e a puta da sombra, não atina?
Um par de dias volvidos e voltava. Mais que o seja, é melhor esquecer o perfume.
Adeus que me vou embora. Adeus que me embora vou. Adeus que me fui embora. Adeus que morto estou.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Luz

Cores

Infinito

quarta-feira, janeiro 17, 2007

"Bananas"

terça-feira, janeiro 16, 2007

A cena do acenar



... aceno o meu curriculo pelas empresas como quem grita pelas praias "Há frutó chocolate!". E lá me vão perguntando de forma atrevidota: "e telemarketing, não?"
Entreguei mais umas candidaturas, acendi mais umas luzes de esperança, vou continuando a cena do acenar...

"Oohh, my God!"

"And i´ll drink to that!"

666 (Call Center)

Impressão...


Colapso. Remate. Agressão. Clepto-coisi-tal, os maníacos. Dramas, tramas, a vida.
Nevoeiro. Fusco, lusco, brusco, susto: luz no horizonte.
Sol. Horizonte. Mão no bolso, face rosada, calor, esplendor, dimensão, infinito: é só sentir a brisa na face e o cheiro da vida lá fora.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Of the wall




Homem solteiro procura emprego para relação estável...

O nosso melhor fato e um grande sorriso: aqui estão os dois principais ingredientes que levamos para uma entrevista de trabalho. Tentando não revelar o nosso desespero por entrar numa vida activa, aprontamos a nossa figura e enchemos o peito de convicções, enchemos a boca de mentiras...

- Cheguei à hora marcada, aguardei um pouco na sala de espera. Quem espera sempre alcança, mas quem espera desespera, vai dizendo o povo. Fui chamado à sala da verdade, ao local onde me dispunha a mostrar ao senhor Joaquim Leitão que eu, não só mereço ser contratado, como até sou a pessoa que ele desesperadamente procura na longa lista de candidatos ao lugar. Mas nem sei como, dei comigo a entrevistar o senhor, desmistificando aquilo que ele ia me dizendo em tom quase poético, em jeito de lírica romanesca - o sacana do tipo queria gente para fazer telemarketing, esta é a verdade. Depois de eu empregar os termos inbound, outbound e telemarketing, a conversa sobre a minha motivação para integrar a equipa da Alico (companhia de seguros), transformou-se num monólogo que podia ter por título "Adeus, ou vai-te embora". O senhor Leitão (o porco!) acompanhou-me à porta, desejando-me felicidades para a minha busca - "obrigado e boa tarde, senhor Leitão."
- Passa-se qualquer coisa de estranho no mundo, ou pelo menos no país, porque parece que só há empregos onde a palavra head-set* lembra uma ferramenta de trabalho e não um grito de alinhamento nas corridas de atletismo. Será por isto que se diz que estamos na era das comunicações?
*Auscultadores usados para comunicar

Redundante

"Watch the bird: the bird is watching you."

Abstracto e generalista

Figura "Comic" original - José Imaginário

"Orange"

Ilustração: José Imaginário; desenvolvido a partir de trabalho escolar

"Rock"

Ilustração: desenho vista, José Imaginário



Substantivo masculino.

Estilo musical surgido em meados da década de 50 nos Estados Unidos, originário do blues e da música country. É caracterizado pela existência de um ou mais vocalistas, baixo e guitarras eléctricas muito amplificadas, bateria, sintetizadores e diversos instrumentos de sopro e percussão;

(Palavra inglesa)



© 2002 Porto Editora, Lda.

"Crosspatch*"

Era um homem desempregado. Terminara os estudos, terminara estágios e o mais. Por estes dias, sem um tostão, andava rezingão - não andamos todos, eventualmente?
Mas naquele dia foi especial: era um assalto. Entrou no super, para comprar something, a little bit of this, a little bit of that - umas merdas. As velhas, os caixeiros e até os carrinhos de super-mercado, todos aproveitavam a oportunidade de tornar a existência do homem mais dolorosa, ora colocando-se no seu caminho, ora dirigindo-se a ele.
Até que se deu o assalto. Dois homens encapuzados entraram de armas em punho, exingindo dinheiro a todos, gritando como loucos, emanando suor e nervos. "Só me faltava esta" foi a última frase que o homem rezingão soltou, pouco antes de sucumbir ao ferimento da bala que um dos assaltantes disparou acidentalmente, quando encalhou num carrinho de compras que foi atirado em fúria por alguém com um único problema: o desemprego.

* resmungão/rabugento

"Deus, Pátria, Família: alicerces de uma geração, ou reflexos de medo (alimentado)?"

domingo, janeiro 14, 2007

"Porta"

Foto: José Imaginário

...estava sentado na cadeira do meu quarto quando vi a luz que iluminava a parede de topo - estarei louco? Era uma porta. Eram cinema, livros, música, um mundo. Coloquei as mãos no teclado e digitei, agitando o marasmo da desinformação. Saí daquele canto escuro onde ninguém apontava caminhos. Opinion makers, addicts (viciados), curiosos e egocentristas - aqui estão todas as pistas. Pessoais ou impessoais, independentes ou dependentes, ausentes ou omnipresentes, underground, emergente - é para toda a gente. Um blog por dia, não sabe o bem que lhe fazia.